quinta-feira, 7 de junho de 2012

À Parreira

Tornou-se lugar comum dizer que Dunga não deixou legado para seu sucessor na Seleção Brasileira. Não que seja uma mentira completa, mas esse comentário ignora o simples fato de que nenhum técnico se preocupa com isso. Historicamente, o foco sempre foi montar um time que finalize o ciclo quando a Copa do Mundo chegar. E agora com Mano Menezes não é diferente.
A chamada para o post abaixo gerou um interessante debate no Facebook. Nesse espaço, conversamos sobre como Mano Menezes promoveu a transição entre o grupo que caiu nas quartas-de-final do último Mundial e o atual. Muitos concordam que o rompimento com a geração e a mentalidade do grupo anterior foi feita de forma correta. Sempre discordei dessa tese e agora tento explicar por quê.
Antes de tudo, é preciso recordar em que país estamos. No Brasil, tanto imprensa quanto torcida não se importam com o estágio em que o trabalho se encontra. Perdeu, é crítica. Ainda mais quando se trata da Seleção. Deste modo, até para evitar uma pressão desnecessária, o melhor caminho talvez tenha sido traçado por Carlos Alberto Parreira em sua trajetória entre 2002 e 2006 à frente do Brasil. Logicamente, alguém vai se lembrar da campanha na Copa da Alemanha, mas o fracasso está muito mais ligado ao descompromisso de alguns jogadores do que à maneira como Parreira conduziu o processo.   
Após a saída de Luiz Felipe Scolari, Parreira não excluiu o trabalho anterior apressadamente. Apesar da concepção de jogo diferente, o técnico manteve os principais nomes do pentacampeonato e o primeiro passo foi mudar o quase improvisado 3-4-2-1 de Felipão para um 4-3-1-2 mais funcional. Parreira também não efetivou os jovens Robinho e Kaká automaticamente, preferindo promover os dois aos poucos. Com isso, manteve o Brasil sempre competitivo durante os quatro anos de seu trabalho. Venceu as Eliminatórias, a Copa América (com uma equipe B), a Copa das Confederações e ainda montou um time que praticava um futebol bem próximo do que nós brasileiros imaginamos como ideal.
Mano Menezes procurou outro caminho. Sob o discurso da proposição de jogo, da retomada do protagonismo e amparado pela ideia de que o Brasil produz jogadores em escala suficiente para adoção de qualquer filosofia, Mano deletou tudo o que Dunga havia feito e tentou partir do zero. Entretanto, o ex-treinador do Corinthians descobriu em pouco tempo que a situação não era exatamente como ele imaginava. Em primeiro lugar, até pela mentalidade de nossos treinadores, formamos durante anos jogadores muito mais de força e potência do que troca de passes e cadência. Em média, os principais nomes produzidos nos últimos anos são atletas de velocidade e profundidade, muito mais voltados para o contragolpe do que para uma “cadência espanhola”. Aqui, os meio-campistas modernos, capazes de marcar, armar e também atacar dão lugar a volantes marcadores ou a meias que só se ocupam da fase ofensiva, como se fosse impossível exercer mais de uma função.
Por esse atropelo nas decisões, Mano passa a impressão de que fez muito pouco em dois anos de trabalho. Só agora, com a corda colocada em seu pescoço pelo presidente da CBF, resolveu apostar tudo num ousado sistema de marcação adiantada e de ocupação do campo adversário. Como a Seleção passou tanto tempo num limbo tático, o prazo é curto para ajustar o time a essa nova mentalidade. Pode dar certo, mas um fracasso nos Jogos Olímpicos deve colocar fim à trajetória do técnico. Caso isso aconteça, vão dizer que a demissão foi provocada pela forte cobrança por resultados tão típica de nosso país. Particularmente, ficarei com o equívoco do descarte de todo o trabalho anterior, algo que o bom senso de Parreira certamente não recomendaria.    
Imagem: Globo Esporte

12 comentários:

Danilo disse...

Michel, mas como o Mano pode incluir o trabalho anterior sendo que o Dunga montou um time para fechar o ciclo de uma copa ? E quais jogadores poderia ser aproveitado da seleção do Dunga ? E você é contra o time brasileiro jogar apenas nos contra-golpes ?

Douglas Muniz disse...

Concordo em parte com você Michel, foi uma decisão totalmente equivocada do Mano ao descartar tudo o que foi feito pelo Dunga. Há nomes que trabalharam com ele que poderiam ser uteis agora. Quanto a questão de estilo de jogo, era mais fácil ir modificando aos poucos ou adequando um sistema tático á mescla desses jogadores que trabalharam com o Dunga, aliado aos jovens que ele vem trabalhando agora. Muitas pessoas acham que o Brasil deva jogar da mesma forma sempre, mas aquele time do Dunga não jogava belo, mas tinha um estilo, uma cara, capaz de jogar igual (e vencer) tradicionais como Itália e Argentina sem passar sufoco contra seleções menores. O que me incomoda ver é um certo desespero, ou algo assim, quanto a maneira que o time jogou nas ultimos amistosos. A marcação pressão bem coordenada, bem treinada, com um jogo mais plural, lhe deixa menos previsível e o Brasil jogou exatamente igual ao das vitórias anteriores, ocultando os inumeros erros defensivos. Contra uma seleção melhor armada táticamente (como é o México), o Brasil perde e jogando muito mal...

Abraços Michel!!!

Michel Costa disse...

Vamos dividir essa questão em dois pontos, Danilo:
Primeiro, acredito que Mano poderia ter aproveitado melhor a geração passada. Num primeiro momento, até a Copa América, dava para aproveitar a base anterior com Júlio César, Maicon, Lúcio, Robinho e Luis Fabiano. A eles somaria Thiago Silva, Marcelo, Lucas, Ramires, Ganso e Neymar. Assim, teríamos um time mais cascudo (para usar um termo da moda) que poderia manter a competitividade, sem abrir mão da obrigatória renovação. No entanto, Mano quis mudar tudo. Montou uma equipe jovem demais, sem rodagem e pagou por isso.
O segundo ponto: Não acho que o time de Dunga jogava apenas no contragolpe. Como o PVC costuma dizer, a versão anterior da Seleção era um time que aproveitava bem os contra-ataques e que tinha dificuldades contra defesas fechadas, mas não era uma equipe que atuava na retranca. Realmente, até por estarmos projetando uma Copa em casa, isso tinha que mudar. Mas isso tem mais a ver com características dos jogadores do que outra coisa.

Abraço.

Michel Costa disse...

Concordo, Douglas. E o problema maior está no fato de Mano estar implantando esse sistema só agora. Antes, o Brasil estava no meio do caminho.
Particularmente, não gosto do estilo kamikaze atual. Essa nunca foi a nossa escola. Mas, é melhor do que ficar naquela mesmice.

Abraço.

Danilo disse...

Michel, qualquer treinador que assuma a seleção brasileira deve armar a equipe de acordo com as características dos melhores jogadores do Brasil ou sempre seguir uma filosofia de futebol ofensivo, mesmo que não tenha jogadores para isso ?
Além da seleções 70 e 82 do Brasil qual outra tinha como característica propor o jogo independente do adversário ?

Gustavo Carratte disse...

Michel, algo que precisa ser levado em consideração é o resultado obtido na Copa anterior. Parreira assumiu um time campeão mundial e Mano Menezes teve pela frente uma Seleção com bases - que antes eram sólidas - completamente abaladas pela derrota nas quartas de final.

Não estou defendendo Mano nem menosprezando Parreira. Penso como você nesse ponto: o trabalho atual poderia ter tido uma renovação menos brusca e o time que chegou à Copa de 2006 foi muitíssimo bem conduzido por seu comandante. Mas o nosso país não tem um projeto a longo prazo, e o resultado no Mundial anterior tem total ligação com a postura que o novo técnico acaba adotando (ou é obrigado a adotar, não sei qual é o tamanho da influência dos engravatados da CBF no planejamento dos treinadores).

Grande abraço,
Gustavo Carratte.

Michel Costa disse...

Acho que, antes de tudo, seleção é lugar para os melhores - coisa que Mano não vinha observando. Também acho que a ofensividade do Brasil é inerente a própria história da nossa seleção. Curiosamente, apesar do futebol de sonhos, o Brasil de 70 era diferente de 82. No Tri, a Seleção recuava até seu próprio campo para só então partir em contragolpe. Em 82 era um time que se atirava mais.

Abraço.

Michel Costa disse...

Gustavo,

Realmente o time de 2010 saiu abalado. Alguns jogadores como Felipe Melo não tinham como seguir com o grupo. Mesmo assim, não havia razão para jogar tudo no lixo como Mano fez. Com essa atitude, ele conseguiu apenas abalar o prestígio da Seleção e reduzir o respeito dos adversários. E o pior, não montou um time.
Também é certo que Mano se deixou influenciar pelo discurso de renovação imediata de Teixeira. Porém, quem paga o pato (sem trocadilhos) sozinho agora é ele.

Abraço.

Douglas Muniz disse...

Eu particulamente não vejo uma característica, um estilo no futebol brasileiro, digo historicamente, não pelo selecionado (em alguns momentos, houveram exceções que poderiam ser citadas: 74, 78, 90, 94), mas pelos times. Uma vez o PVC disse algo que eu pensava bastante, mas notava que outros jornalistas não se atentavam: por exemplo, o futebol gaúcho, o estilo de suas equipes são calcados mais na rigidez tática e trabalho defensivo, mais pragmático, enquanto que mais no Rio de Janeiro, são mais equipes que previlegiam o toque de bola, mesmo no Nordeste, um estilo mais ofensivo, com mais velocidade na frente. Aqui em São Paulo, um estilo mais competitivo, sem abrir mão da técnica... Acho que a seleção pode ter um estilo mais plural no seu jogo, sem se apegar a um estilo único, seja ele ofensivo ou defensivo... Penso eu...

Abraços!!!

Alexandre Rodrigues Alves disse...

Acho que o Brasil jogou bem contra a Argentina, de forma ofensiva e com vontade, mas permitiu muito espaço no meio campo, mais do que a Argentina proporcionou; como as duas defesas que atuaram ontem são fracas, ficou a cargo do melhor jogador em campo aproveitar as chances e concluí-las; fica claro que o tempo que o Mano Menezes perdeu com Ronaldinho Gaúcho como o "condutor" da Seleção fará falta para a Olimpíada, pois com esse time mais jovem o Brasil ainda precisa corrigir o meio campo, a zaga e não depender tanto da inspiração do Neymar. Será que, por exemplo, mesmo o Brasil ganhando uma prata ou um bronze, e jogando bem, o Mano cai? Sobre o Parreira, acho que ele acertou na maioria dos nomes, mas não testou variações para o time; caiu no oba-oba de quarteto mágico e praticamente esqueceu o 4-3-1-2 que usou até 2005, só voltou com ele no desespero no jogo contra a França, qdo viu que o time não andava com as duas "torres" no ataque.

Michel Costa disse...

Verdade, Douglas. Mas, se puxarmos pela memória, creio que não houve uma Seleção com essa proposta de jogo. Para mim, Mano resolveu arriscar porque sabe que seu pescoço está a prêmio. Pode dar certo, mas está muito em cima da hora.
Quanto ao estilo de jogo realmente não há um padrão. O que existe é um conceito de como a Seleção deve jogar. Mesmo assim, ele não é bem definido.

Abraço.

Michel Costa disse...

Duvido que Mano resista a uma derrota nos Jogos, Alexandre. Durante sua gestão, o Brasil perdeu prestígio e está se acostumando com a derrota, o que é péssimo. Não acho que ele seja treinador para uma Seleção pentacampeã mundial. Talvez seja um dia, mas ainda não é.

Sobre 2002-2006, Parreira precisou mudar porque seu 4-3-1-2 não estava funcionando. Dominava os adversários mas tinha dificuldade para definir os jogos. Mais ou menos como acontece com a Espanha agora. Percebendo isso e atendendo a um clamor popular, Parreira sacou Juninho e escalou Robinho. O time ficou mais leve e o futebol fluiu melhor. O problema é que o técnico não quis barrar Ronaldo (pelo nome) e Adriano (pela fase até 2005) a acabou escalando os dois. Como ambos estavam mal, o jogo parou de funcionar justamente quando mais se precisou dele. E quando quis mudar já era tarde. O Brasil não treinava no 4-3-1-2 há um bom tempo e a França estava voando.

Abraço.