sábado, 28 de junho de 2014

No sufoco


Quando Luiz Felipe Scolari apontou o Chile como o adversário mais difícil para o Brasil numa eventual disputa de oitavas de final, muitos acharam graça. Quem sabe, uma estratégia do experiente treinador. Este colunista entendia que o estilo do rival sul-americano era o que melhor se encaixava com o tipo de futebol que a Seleção Brasileira pratica. Talvez fosse a forte lembrança da equipe comandada por Marcelo Bielsa que partia para o ataque e oferecia espaços para contragolpes. Não foi o que se viu no Mineirão na tarde de hoje. Mais do que nunca, o time de Jorge Sampaoli foi um duro oponente, somente batido nos pênaltis.

As estatísticas dizem que a Seleção Brasileira teve um aproveitamento de apenas 68% nos passes. O pior desempenho nesse fundamento desde o Mundial de 1966. Um reflexo de que a entrada de Fernandinho no time não foi suficiente para resolver o crônico problema da saída de bola, algo que, logicamente, não se resolveria de uma hora para outra, já que existe uma forma estabelecida de jogar e isso dificilmente mudará sem muitos treinos. Outra estatística, esta quase ignorada, foram as de finalizações. O Brasil concluiu 23 vezes contra a meta de Claudio Bravo, 13 no alvo. O Chile, mesmo com 51% de posse de bola, finalizou em 13 ocasiões, apenas cinco contra Júlio César. Numa delas, Alexis Sanchez empatou o jogo.

Números à parte, não se deve perder de vista a força do Chile que dominou a partida por um grande período e esteve a um travessão da vitória. Em outras oportunidades os comandados de Jorge Sampaoli enfrentaram selecionados tradicionais e também foram melhores. Como na derrota por 1 a 0 para a Alemanha num amistoso em Sttuttgart, quando os visitantes colocaram os germânicos em sérias dificuldades e saíram de campo aplaudidos. Ou, para ficar num exemplo mais recente, a categórica vitória que eliminou a campeã Espanha. Um estilo tão agressivo que fez com que o treinador holandês Louis van Gaal os classificasse como “fanáticos”.

Contudo, a constatação do poderio chileno não pode esconder que, além das dificuldades encontradas com a bola, a Seleção Brasileira também não se mostra emocionalmente estável. Possivelmente, o peso de disputar um Mundial em nossos domínios faz com que a pressão natural que um pentacampeão enfrenta a cada Copa seja ampliada ainda mais. E, ao que tudo indica, esse fardo se tornou pesado demais até para um grupo cuja maioria é composta por atletas acima dos 25 anos. Na próxima sexta-feira, o Brasil terá mais um desafio complicado ao se defrontar com a sensação Colômbia, dona do melhor desempenho defensivo e ofensivo do torneio. Uma barreira que pode ser ultrapassada, desde que a Seleção não esbarre nos próprios bloqueios.

Coluna escrita originalmente para o site Doentes por Futebol.
Imagem: FIFA.com

sexta-feira, 27 de junho de 2014

Nada é para sempre

Houve um tempo em que a Copa do Mundo era o oráculo do futebol. Ditava tendências táticas, elegia os mitos da bola, encerrava ciclos vitoriosos. Atualmente, num mundo globalizado, onde as grandes ligas nacionais e a UEFA Champions League reúnem os maiores craques do planeta, o mais correto talvez seja dizer que a Copa consolida o que esse esporte tem de mais interessante. Dos efeitos devastadores que o fim de uma temporada pode causar nos jogadores até a capacidade de superação das maiores estrelas. Paralelamente, ainda nos brinda com uma inigualável comunhão entre os povos. E algo assim não tem preço.
Dentro de campo, o Mundial de 2014 vem tratando de desmistificar o establishment tático ao trazer de volta sistemas outrora considerados superados pelos especialistas. Carlos Alberto Parreira, coordenador técnico da Seleção Brasileira, costuma dizer que não há mais nada a ser inventado no futebol, mas talvez possamos falar em reciclagem de velhos esquemas. É exatamente o que a Holanda vem fazendo em nossos gramados. Organizada em num 5-3-2 – que pode variar para 3-5-2 ou 3-4-3 – a Orange tem desafiado a lógica desses sistemas ao não apenas conceder poucas oportunidades como também marcar muitos gols. Foram dez apenas na primeira fase, dois a mais do que a Espanha anotou em toda sua campanha vitoriosa em 2010. Tal estilo foi nomeado pelo técnico Louis van Gaal de reaction football, ou seja, a reação de uma equipe ao que a outra se propõe a fazer com a bola. Não é preciso ser um gênio para saber o que os holandeses, ofensivistas por natureza, estão pensando da novidade.
O fato é que esta Holanda, mesmo sem contar com uma brilhante geração, se classificou na primeira colocação do grupo B deixando a Espanha pelo caminho tendo, inclusive, aplicado um sonoro 5 a 1 na Roja. Um resultado chocante que se tornou o prenúncio da eliminação da atual campeã quando esta também caiu diante do Chile, sempre vendo seus rivais imprimirem um ritmo que nem de longe poderia equiparar. Um declínio que pode ser visto como o ocaso de uma geração que conquistou duas Eurocopas e um Mundial apresentando um futebol técnico e, sobretudo, coletivo, uma marca da competição realizada na África do Sul.
Curiosamente, o que parecia ser uma tendência nos jogos de seleções não vem se confirmando agora. Se há quatro anos o Mundial ficou marcado pela força do coletivo suplantando ou anulando as individualidades, agora estamos vendo selecionados sendo orientados de forma a dar liberdade para que os craques decidam os confrontos. O Brasil de Neymar, a Argentina de Messi e a Holanda que trabalha para liberar Robben por mais faixas do gramado são bons exemplos. O que não significa que o coletivo tenha perdido o seu valor, algo que Chile, Estados Unidos e Costa Rica tratam de desmentir categoricamente, confirmando apenas que não existe verdade absoluta no futebol. Ainda bem.
Fotos: Sky Sports e Getty Images

segunda-feira, 23 de junho de 2014

Ninguém disse que seria fácil


Antes do início da Copa, o técnico Luiz Felipe Scolari e o coordenador Carlos Alberto Parreira foram taxativos ao colocar o Brasil como candidato ao título mundial. Naquele momento, eles sabiam que era importante deixar claro para todos, jogadores inclusos, que a Seleção Brasileira tinha essa meta e que seria capaz de alcançá-la. Obviamente, ali estava uma declaração que era muito mais a marcação de uma posição do que uma bravata. Contudo, faltou dizer que não seria fácil.

Durante o primeiro tempo da partida contra Camarões, a equipe de Felipão apresentou o velho problema que a acompanha desde a Copa das Confederações: Sem a presença de armadores natos, o time resumia grande parte de seu repertório aos lançamentos longos dos zagueiros para Hulk e Neymar. O meio-campo inexistia na fase ofensiva, salvo por momentos em que Oscar recuperava a bola e tentava acionar os companheiros de frente. Paulinho, muito mais um volante de infiltração do que meia, pouco se apresentava para fazer com que a transição acontecesse de forma mais “limpa”.

A insistência do técnico com o jogador do Tottenham baseava-se na confiança no trabalho realizado há um ano, quando Paulinho foi um dos destaques da conquista intercontinental. Retirá-lo na primeira ou segunda partida significaria queimar um nome que foi muito útil no passado e que poderia sê-lo no futuro. Sendo assim, todas as chances foram dadas, mas Paulinho não correspondeu. Agora chegou a vez de Fernandinho. Mais rápido, mais passador e com boa finalização de fora da área, o volante do Manchester City fez em 45 minutos o que o companheiro não havia conseguido até então. Dentro de uma normalidade, será titular diante do Chile.

Sofrimento à parte, a classificação brasileira se deu em primeiro lugar como era esperado. E dentro das características das seleções do grupo B, o Chile é o adversário que mais se encaixa nas virtudes do Brasil. A Holanda, ao contrário, manteria sua atual estratégia de se postar na defesa e explorar os avanços de Robben nas costas dos instáveis Daniel Alves e Marcelo. Sem dúvida, um perigo maior. Por sua vez, o Chile sai mais para o jogo, tem uma defesa que sofre quando pressionada e, sobretudo, apresenta fragilidade nas jogadas aéreas.

No entanto, coletivamente, ninguém está jogando mais do que a equipe comandada pelo argentino Jorge Sampaoli. Para a desconfiança de alguns – o colunista entre eles – Scolari chegou a dizer que o rival sul-americano era aquele que mais o preocupava dentre as combinações de oitavas de final. Se for verdade ou apenas jogo de cena para esconder a preferência por um oponente mais abordável, não se sabe. De qualquer modo, Felipão nunca disse que seria fácil.

Coluna escrita originalmente para o site Doentes por Futebol.
Imagem: Reuters

terça-feira, 17 de junho de 2014

Empate amargo


A animada torcida mexicana que ajudou a lotar o Castelão teve motivos para festejar. Durante boa parte da partida, viu sua equipe ser superior à Seleção Brasileira levando sustos à meta de Júlio César. Por outro lado, também torceu muito por seu goleiro Ochoa que viveu tarde inspirada e se tornou o principal responsável pelo zero a zero final. Com o resultado, o México divide a liderança do grupo com o Brasil e agora decide a classificação diante da Croácia.

Por sua vez, Luiz Felipe Scolari deveria ter muito a refletir. Embora sua Seleção não tenha mostrado o nervosismo da estreia, deixou de mostrar futebol. O meio-campo, fundamentalmente na figura de Paulinho, não conseguiu controlar o jogo e em diversos momentos parecia esvaziado. Para piorar, todas as alterações realizadas pelo técnico não indicavam que havia ciência desse problema. Primeiro, trocou Ramires, pendurado por um cartão amarelo, por Bernard. Depois, imaginou que Jô poderia desempenhar melhor o papel de pivô que Fred não conseguiu. Por fim, trocou um meia por outro ao substituir Oscar por Willian.

Turrão como lhe é peculiar, Scolari disse na coletiva pós-jogo que viu evolução desde a estreia e que os torcedores muitas vezes esquecem que há um adversário do outro lado e que este jogou bem. Pelo menos em parte, o treinador tem razão. O time de Miguel Herrera conseguiu neutralizar as principais jogadas da Seleção contendo as arrancadas de Neymar e isolando Fred totalmente. Todavia, o treinador brasileiro ignorou, pelo menos diante dos microfones, a incapacidade do seu meio-campo de gerar jogo. E isso com Fernandinho e Hernanes no banco. Se não havia a intenção de ter reservas capazes de qualificar a organização das jogadas, por que convocar dois atletas com essas características?

Não saberemos a resposta dessa pergunta, pois ela simplesmente não foi feita na coletiva. No entanto, tivemos pistas de que os titulares estão mantidos para a partida diante de Camarões, possivelmente com o retorno de Hulk. É a convicção de um técnico que não parece interessado em observações externas. Só resta torcer para que ele não morra abraçado com ela.
Coluna escrita originalmente para o site Doentes por Futebol.
Imagem: Mike Blake/Reuters

sexta-feira, 13 de junho de 2014

O emocional como maior adversário


Como esperado, a estreia brasileira na Copa do Mundo foi uma partida complicada. O choro de alguns jogadores da Seleção e a perceptível emoção estampada nos rostos de todos indicavam que o time começaria com os nervos à flor da pele. E foi o que aconteceu. Oscar, o melhor em campo dentro dos noventa minutos, começou disperso e perdeu duas bolas que originaram contra-ataques perigosos da Croácia. Num deles surgiu o gol contra de Marcelo. Ainda no lance que abriu o placar, Daniel Alves tentou, inexplicavelmente, pressionar o goleiro Pletikosa e acabou deixando um imenso vazio na lateral direita que o atacante Olic soube aproveitar bem.

E foi exatamente após o gol croata que surgiu o pior adversário do jogo: Dominar o próprio emocional e buscar a reação. Marcelo mostrou logo que não se intimidaria e exibiu uma raça incomum até mesmo para ele. Oscar, que estava desaparecido, ressurgiu para uma das maiores exibições de sua carreira, atuando com destaque nos desarmes, na armação de jogadas e também nas conclusões. Por sua vez, Neymar assumiu a responsabilidade de ser o protagonista da Seleção Brasileira e materializou isso no chute imprevisível que igualou o marcador e na cobrança do pênalti incorretamente assinalado.

No geral, é possível dizer que o time respondeu bem a uma situação adversa. Há um pouco de ingenuidade em esperar que esta Seleção Brasileira coloque ordem na casa trocando passes como faria a Espanha, por exemplo. Não é o DNA deste time. E nem do futebol brasileiro atual. Durante anos, formamos jogadores que combinam habilidade com velocidade e isso não deve mudar por enquanto. Mesmo com 61% de posse, a resposta foi dada em forma de pressão, velocidade e verticalidade. E dificilmente seria diferente disso.

Coletivamente, o grande dilema do Brasil no Mundial será controlar a volúpia que o faz pressionar os rivais no campo de ataque com a responsabilidade de não expor sua defesa. Uma marcação que gerou apenas cinco faltas, o que é positivo, mas que também cedeu espaços preocupantes. Como a estreia ficou para trás e os três pontos foram somados, espera-se uma Seleção mais segura e inteligente no segundo duelo diante do México e que as adversidades sejam apenas as impostas pelos comandados do técnico Miguel Herrera.   
Coluna escrita originalmente para o site Doentes por Futebol.
Imagem: Marcos Ribolli/Globo Esporte

quarta-feira, 11 de junho de 2014

A difícil estreia

Um dos maiores clichês do futebol diz respeito aos jogos de estreia em Copas do Mundo. Nove em cada dez treinadores possivelmente dirão que o primeiro desafio do torneio é sempre o mais difícil por todos os elementos que o envolvem: A tensão de colocar em prática tudo o que foi treinado na preparação, a ansiedade dos jogadores, a necessidade de começar com vitória para não depender tanto dos outros jogos para se classificar, a recepção da torcida local e outros fatores fazem da estreia um evento singular num Mundial. Contudo, no caso específico da Seleção Brasileira, essa máxima é mais do que verdadeira.
A Croácia, além do simples fato de ser o primeiro adversário, é o rival mais complicado do grupo A. Em recente entrevista publicadano blog do jornalista Paulo Vinícius Coelho, o técnico dos croatas em 1998, o bósnio Miroslav Blazevic foi enfático ao dizer que seu ex-time não vai perder para o anfitrião. Para tanto, apoia sua opinião na tese de que a Croácia possui o melhor meio-campo da competição. Composto por Modric, Kovacic e Rakitic, é justo dizer que Blazevic apontou o setor que mais se destaca na equipe comandada por Niko Kovac. No entanto, é cedo para classificá-la de forma tão definitiva.
Ao contrário do que se imagina, o amistoso contra a Sérvia não simula o que será encontrado diante da Croácia. Os sérvios, que não estarão na Copa, têm um time mais físico, embora menos talentoso, e isso criou muita dificuldade para os principais criadores do Brasil. No gramado pesado e castigado do Morumbi, enfrentar a fração sérvia da velha Iugoslávia foi muito mais um risco à integridade física dos atletas do que uma simulação do que será visto na Arena Corinthians.
Com os nomes que possui, espera-se uma Croácia tentando ficar com a bola nos pés. Essa característica pode dar ao Brasil a oportunidade de pôr em prática sua maior qualidade: recuperar a posse no campo de ataque e utilizar a velocidade para chegar ao gol. Por outro lado, podemos ver um adversário capaz de controlar o jogo no meio e criar um desconforto que a Sérvia não foi capaz, gerando um cenário complicado num confronto sediado numa cidade conhecida por sua pouca tolerância com o time canarinho. Mas quem disse que estreia é fácil?
Coluna escrita originalmente para o site Doentes por Futebol
Foto: Getty Images

domingo, 1 de junho de 2014

Sete jogos para a história

O genial Diego Maradona costuma dizer que antes da Copa de 1986 não estava entre os mais cotados para ser o melhor daquele Mundial. Segundo o argentino, Michel Platini, Zico e outros estavam acima dele na preferência geral. Naquele período, Maradona buscava reerguer sua carreira no Napoli após uma desgastante passagem pelo Barcelona. O restante desta história, todos conhecem.
Neymar não fez uma boa temporada pelo Barça. O próprio time catalão não foi bem neste certame, é justo dizer. Mesmo assim, o atacante brasileiro ficou devendo, até pelos valores que envolveram sua contratação junto ao Santos. Vale lembrar as lesões sofridas durante sua nova jornada na Espanha, mas certamente se esperava mais dele.
Confortável na condição de principal nome da Seleção Brasileira, Neymar vem sendo um dos destaques nos treinamentos da equipe de Scolari. Com mais liberdade para se movimentar em comparação com seu posicionamento no Barça, o camisa 10 tem conseguido realizar boas jogadas e marcar gols de rara categoria. Dentro das variações previstas pelo técnico, Neymar pode deixar a ponta esquerda e se posicionar atrás de Fred, como um autêntico ponta-de-lança, fazendo jus ao número que carrega e com a possibilidade de jogar de frente para o gol.
Em termos de desgaste físico, o jogador também não tem do que se queixar. Além dos períodos em que esteve entregue ao departamento médico do Barcelona, foi substituído ou saiu do banco de reservas em diversas ocasiões. E com o esmero de Paulo Paixão na preparação física, é praticamente certo que gás não lhe faltará. Em contrapartida, seus principais rivais pelo trono, Messi e Cristiano Ronaldo, devem chegar ao Brasil longe de suas melhores formas.
Obviamente, Neymar não é Maradona. Não se espera que ele, aos 22 anos, carregue um selecionado nas costas como El Pibe fez em seu auge. Todavia, não restam dúvidas de que se trata de um jogador precioso e que tem um horizonte propício para realizar uma excelente Copa, quem sabe até com o título. Caso isso aconteça, poucos se lembrarão da temporada apagada na Europa quando estiverem votando no melhor do mundo em 2014.     
Coluna escrita originalmente para o site Doentespor Futebol.
Imagem: Jefferson Bernardes/VIPCOMM