domingo, 10 de agosto de 2014

Brasil em duas frentes

O saudoso Millôr Fernandes costumava dizer que imprensa é oposição e que o resto é armazém de secos e molhados. Particularmente, costumava preferir a versão de que a imprensa deveria ser imparcial e isenta, mas os anos me ensinaram que isso não passa de utopia. Em cada análise sempre há uma opinião implícita e um julgamento de valor que muitas vezes não é o mais correto. No caso do nosso jornalismo esportivo, a posição está clara: A CBF está errada até quando acerta. Não que isso seja comum, obviamente.

Um desses raros acertos é o anúncio de uma Seleção Brasileira Olímpica que caminhe paralelamente à principal. O plano arquitetado por Alexandre Gallo e Dunga, os respectivos técnicos, e o coordenador Gilmar Rinaldi é que 46 jogadores sejam chamados a cada convocação. Serão duas equipes com objetivos diferentes. A primeira, composta por atletas com idade olímpica, será comandada por Gallo e terá como meta preparar o grupo que disputará os Jogos do Rio de Janeiro em 2016. Um time que fará uso das mesmas datas FIFA e mandará suas partidas, prioritariamente, nos estádios utilizados na Copa do Mundo. A segunda, treinada por Dunga, cumprirá o ciclo até 2018.


Responsável pela base da Seleção desde 2013, Gallo foi o único “sobrevivente” da hecatombe que atingiu a comissão técnica. Durante o Mundial, assumiu o papel de observador de Luiz Felipe Scolari, mas não foi incluído na lista de dispensas da CBF. Com dois títulos do Torneio de Toulon no currículo, ouve de seus críticos que sua filosofia privilegia a participação de jovens altos e fortes, preferencialmente mais velhos, em detrimento dos mais talentosos. Um erro, uma vez que o primeiro objetivo das categorias menores sempre será revelar jogadores de qualidade.

Discussões à parte, caberá ao treinador a exclusiva montagem de um selecionado voltado para os Jogos tendo datas e estrutura para isso. Algo inédito em se tratando de Seleção Brasileira. Desde os Jogos de Los Angeles em 1984, nossos elencos olímpicos são montados no apagar das luzes, no máximo com a convocação alguns nomes para a composição do grupo principal. Inseridos num contexto distinto, os garotos não moldam um time, apenas passam a fazer parte de um ambiente estelar que, em alguns casos, nem corresponde à realidade.     

Ouro em Londres, o México foi fartamente elogiado justamente por essa estratégia executada pelo técnico Luis Fernando Tena. Chegou a hora de o Brasil ter um planejamento semelhante. Mesmo que a razão seja o fato do torneio acontecer em nosso território, a iniciativa não deixa de ser louvável. Frequentemente, estamos dispostos a criticar a CBF. Talvez seja este o momento de elogiar sem, necessariamente, sermos tachados de armazém de secos e molhados.

Coluna escrita originalmente para o site Doentes por Futebol.
Imagem: Claude Paris/AP

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