segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Melhores do mundo?

Caio Júnior é um bom sujeito. Ex-jogador de algum talento e ex-comentarista esportivo acima da média, Caio decidiu ser treinador e, entre altos e baixos, vem construindo uma carreira interessante. No fim de 2011, entre a demissão do Botafogo e a contratação pelo Grêmio, voltou a ser notícia ao visitar o poderoso Barcelona. Rapidamente, tentaram colar em sua testa um rótulo de “novo Guardiola”, alguém que seria capaz de tirar o futebol brasileiro da mesmice.
Em entrevista ao jornalista Marcus Alves, Caio trata de esclarecer que não se trata disso: “Ah, as pessoas estão misturando um pouco pelo fato de eu ter ido lá e querer implementar no Grêmio. Não é bem isso.” Em seguida, o técnico gremista se mostra antenado com o que está acontecendo no mundo: “Não é só o Barcelona. O conceito de tudo que vem acontecendo por aí é o que eu procuro trazer para meu trabalho. A gente tem que estar atualizado. E, então, nesse momento, o Barcelona é a maior referência porque chama muito a atenção. O futebol hoje mudou e tem gente que não consegue enxergar.”
Caio está certo. E apesar do mau início no tricolor gaúcho, é muito bom saber que um treinador brasileiro abriu seus olhos para a evolução do esporte. O problema vem depois, quando o paranaense diz que os técnicos brasileiros são os melhores do mundo porque sabem lidar com jogadores que não estão bem preparados taticamente e por enfrentarem uma pressão maior. De certo modo, uma opinião semelhante àquela manifestada por Muricy Ramalho antes do Mundial Interclubes.
Impossível não observar o equívoco deste pensamento. Saber ou, pelo menos, tentar lidar com adversidades e trabalhar sob pressão de mídia e torcida não fazem de nossos treinadores os melhores do mundo. No máximo, isso atesta boa capacidade de atuar em ambientes que não são ideais e até hostis. Desde Carlos Alberto Parreira, que com apenas 24 anos se aventurou a treinar a seleção de Gana, não faltam exemplos de treinadores brasileiros que desbravaram o mundo sem medo do que encontrariam. No entanto, embora isso seja digno de nota, não transforma a classe em top.
Para serem os melhores, os técnicos brasileiros precisam confrontar e superar os melhores. Hoje, isso só é possível nos maiores campeonatos europeus. Ali, entre feras como José Mourinho, Guardiola e Alex Ferguson, é que alguém realmente se prova. Nos últimos anos, nomes como Parreira, Vanderlei Luxemburgo, Luiz Felipe Scolari e Leonardo tentaram e não foram bem. Em cada caso, faltou alguma coisa para que o êxito fosse alcançado.
Além disso, falta aos nossos profissionais a capacidade de inovar e implantar novas técnicas e conceitos. Até pouco tempo atrás, nossos treinadores ainda se agarravam ao velho 3-5-2 que a Europa – salvo raras exceções – abandonou faz tempo. Sem falar na pouca compactação, nos duelos individuais e dos meios-de-campo conscientemente esvaziados de talento. Por sua entrevista, Caio Júnior percebeu que essas práticas estão em desuso. Embora isso não seja suficiente para colocá-lo entre os melhores do mundo, pelo menos mostra que alguém por aqui já abriu os olhos. Mesmo que parcialmente.
Imagem: Zero Hora

10 comentários:

Arthur Barcelos disse...

Torcedor tem uma grande parcela de culpa também. Triste ver no Brasil que aquele velho pensamento ainda impera: lateral só serve para cruzar; volante, marcar; meia, armar e assim por diante.

O problema não é nem utilizar o 3-5-2. E sim, o estilo de jogo apresentado por aqui.

Anacrônico. Essa é a palavra que melhor define o futebol brasileiro.

Michel Costa disse...

Sinceramente, acho que o torcedor é quem menos tem culpa nessa equação, Arthur. Até porque, o que as pessoas mais cobram de seus times e da Seleção (além das vitórias, claro) é que joguem bem.
Por sua vez, os técnicos, em sua grande maioria, só pensam em preservar seus empregos sempre colocados em xeque por dirigentes amadores. Daí não ousam, preferem o comodismo da retranca. Sem falar na falta de tempo para implantar qualquer coisa graças a um calendário massacrante.
Quanto ao citado 3-5-2, nem falo tanto do módulo, mas da mentalidade. O sistema só ilustra isso.

Abraço.

Arthur Barcelos disse...

A parcela é pequena, de fato. Porém, quando alguém "inova", é corneteado. Exemplo: o próprio Caio Júnior. O que teve de torcedor criticando após o revés no primeiro jogo... É preciso mais paciência do dirigente, mas também do torcedor.

Alexandre Rodrigues Alves disse...

Caio Júnior é um novo Renê Simões; ótimo comentarista, mas treinador mediano, se tanto; incrível como nas entrevistas dele pós-jogo ele sempre analisa o jogo como se fosse comentarista ainda e normalmente frita seus jogadores quando erram e não consegue reverter momentos adversos de suas equipes (Palmeiras/07, Flamengo/08 e Botafogo/11); sobre a opinião dele sobre os técnicos ele falou mais ou menos o que o Muricy disse no fim do ano passado, mas com mais educação, o que obviamente está errado pelos motivos que você citou; claro que aqui tem menos tempo para o técnico trabalhar (em média), mas o fato é que falta mais atualização para a maioria deles. Parabéns pelo blog, espero voltar mais vezes.

Michel Costa disse...

Acho que o treinador não pode dar muito ouvido para a torcida, Arthur. Para o torcedor médio, se o time não vence já é motivo para pedir a cabeça do treinador. Torcedor é paixão, não razão. Por essas e outras, acredito que o treinador que busca a vitória e que arma seu time ofensivamente está mais próximo de cair nas graças da massa. Aqueles que estão mais preocupados em manter o pescoço intacto são os maiores candidatos a receberem primeiro o coro de burro.

Michel Costa disse...

Também acho que o Caio tem que amadurecer mais um pouco na profissão, Alexandre. Quanto ao tema central do post, fico imaginando o que passa pela cabeça dos nossos treinadores para acharem isso. Fosse assim, com o dinheiro que o futebol brasileiro tem hoje, a conquista da Libertadores por um time local deveria ser obrigatória. Afinal, se os melhores profissionais da América estão aqui...

Abraço e obrigado pela visita.

Alexandre Rodrigues Alves disse...

Olha o personagem do post aprontando de novo (ele tem de virar comentarista logo, se tirar a vaga de uns 2 da Band, já está ótimo):http://espn.estadao.com.br/gremio/noticia/239905_CAIO+JUNIOR+SAI+DO+SERIO+E+DESABAFA+CONTRA+PRESSAO+EXAGERADA+NO+GREMIO

Michel Costa disse...

Curiosamente, Falcão deu uma entrevista parecida à Placar deste mês. Nela, o ex-volante reclama da mentalidade brasileira e está coberto de razão. No entanto, acho difícil que isso mude de baixo para cima. Acredito que isso só vai mudar quando surgir algum dirigente evoluído capaz de apostar num projeto de longo prazo e for bem-sucedido. Aí sim, temendo ficar para trás, os outros cartolas copiarão a fórmula de sucesso.

Alexandre Rodrigues Alves disse...

Também acho que a mentalidade no Brasil é muito imediatista e a imprensa tem culpa nisso; pede para copiarmos os bons modelos europeus,mas depois de duas derrotas, já começa o zumzumzum de queda de técnico e a contratação de alguém que está no mercado. Concordo que precisa vir alguém e mudar essa mentalidade; o SP parecia querer fazer isso, mas caiu na vala comum depois de cometer algumas burradas como Carpegiani e Adilson. Só acho que o Caio Junior deu uma de Cuca e acusou muito cedo o golpe; além disso deu a entrevista muito para se vangloriar, o que é algo que ele faz com certa frequência.

Michel Costa disse...

Verdade. Naquele momento, o Grêmio tinha vencido uma simples partida de Estadual e mesmo assim Caio mostrou-se emocionalmente exaurido. Se ele pretende seguir na carreira, terá que compreender o meio em que vive e não querer mudá-lo, pois isso só vai servir para prejudicá-lo.
Falcão, agora no Bahia, é outro que vai precisar da mesma consciência. Sem falar no Cuca que tem mais tempo de estrada e continua mostrando a mesma instabilidade de sempre.