sábado, 27 de junho de 2015

A cultura do sofrimento

Como velha raposa do futebol que é, Ramón Díaz sabia o que fazer para anular a Seleção Brasileira. Observou o que o compatriota José Pékerman havia feito com a Colômbia e adiantou sua marcação para explorar o crônico problema brasileiro na transição entre defesa e meio-campo. Como ocorria com Luiz Felipe Scolari, a equipe de Dunga sofre tanto para sair jogando quanto para manter a bola em seus pés. Sem conseguir usufruir da posse, restava apenas a tentativa dos contragolpes que se tornaram a única alternativa após o gol nascido na primeira boa escapada.
Numa de suas entrevistas coletivas, Dunga declarou que o sofrimento daria a tônica do percurso de seu selecionado na Copa América. E assim foi. Sofreu diante de Peru, Colômbia, Venezuela a na eliminação diante do Paraguai. Desses quatro, apenas os colombianos eram rivais de destaque no atual cenário mundial. Nos outros casos o Brasil penou justamente por não conseguir transformar sua superioridade técnica em domínio e, sobretudo, em gols que dariam a tranquilidade necessária. Um episódio emblemático ocorreu diante da Venezuela, quando Dunga optou pela entrada de mais dois zagueiros e viu um adversário que estava praticamente batido ressuscitar e quase empatar.  
Sofrimento normalmente gera pressão. E pressão pode provocar nervosismo. E isso provavelmente explica o pênalti absolutamente desnecessário cometido por Thiago Silva e que acabou resultando no gol paraguaio. Uma instabilidade preocupante ainda mais por se tratar de um zagueiro experiente e que figura entre os mais valiosos do planeta. Não é absurdo dizer que o Paraguai não levava perigo suficiente para chegar ao empate sem uma mãozinha do defensor. E não há dúvida de que daqui em diante seu nome sempre será questionado por imprensa e torcida.
Quem também sofre é o presidente da CBF, Marco Polo Del Nero. Acuado pelas investigações do FBI e da Polícia Federal, o dirigente pode tentar desviar o foco de si para a escolha de um novo treinador para substituir Dunga. Muitos dirão que não faltam motivos para a troca, o que até pode ser verdade. No entanto, em nome da continuidade do trabalho, recomenda-se que o técnico permaneça. Independente do nome escolhido para a sequência, os problemas indicam que o sofrimento deve dar a tônica até a Copa do Mundo de 2018. Talvez Dunga não esteja tão errado assim.    
Coluna escrita originalmente para o site Doentes por Futebol
Crédito da imagem: Reuters

2 comentários:

Alexandre Rodrigues Alves disse...

O Dunga não é a causa do problema, é muito mais uma consequência de anos de soberba baseados em alguns bons resultados que mascararam uma queda nos conceitos de posse de bola, controle, armação, de pensar o jogo. Anos que fizeram o Brasil acreditar que apenas o talento individual resolveria todos os problemas. Hoje, com todos mais nivelados, não adianta apenas achar que alguém vai resolver as partidas sozinho. A geração atual do Brasil não é totalmente horrível, mas o time, que não tem tantos protagonistas no futebol mundial, precisa ter o mínimo de trabalho de conjunto

O problema é muito mais amplo no futebol nacional. É necessária uma mudança total no comando do futebol brasileiro, sendo que muitos que estão lá deveriam estar presos. Passando nos conceitos do que é apresentado em campo. Além de uma lição de humildade e de menos ilusão, até mesmo para uma boa parte da imprensa, que continua vivendo de oba-oba e desconhecimento. Talvez uma não ida a alguma Copa também ajude…

Michel Costa disse...

Sem dúvida, Alexandre. Pessoalmente, não concordo com a ideia de que a geração atual é ruim. Pode não ser tão recheada de estrelas como a de 2006, por exemplo, mas grande parte do grupo atual atua com destaque nos principais times e campeonatos do mundo. Material para construir uma equipe mais forte existe, no entanto, para lograr êxito, é preciso que compreendam todas as demandas que o futebol moderno exige, começando pelo básico: organização e planejamento de médio/longo prazo.

Abraço.