Alguma coisa está mudando no futebol brasileiro. Lentamente, como tudo
costuma ser, mas existem forças positivas em andamento dentro de uma estrutura
historicamente arcaica. É verdade que o nível de endividamento dos clubes
continua alarmante, que a política demissionária de técnicos segue imperando e
que a cartolagem – sobretudo de federações estaduais e CBF – continua sendo um
entrave. No entanto, em diversos aspectos podemos constatar avanços
consideráveis que não podem ser ignorados. Pontos que, reunidos, formam uma
pequena e silenciosa revolução que chama a atenção de quem sempre manteve um
espírito crítico em relação ao futebol local.
Dentro de campo, já é visível a maior compactação e intensidade nas
partidas. A imagem de um futebol brasileiro moroso e espaçado vem dando lugar a
jogos mais rápidos e dinâmicos. Com isso, boas partidas vêm deixando de ser
algo raro no Brasileirão. É certo que as longas viagens e o calendário inchado
são um empecilho quando se pensa na aplicação de velocidade Premier League,
porém, nota-se que a referência mudou. Os times nacionais ainda não são
intensos como as principais equipes europeias, mas o Brasil não tem sido mais uma
ilha isolada no planeta.
E tal mudança não passa apenas pelos jogadores e treinadores. Embora
essa questão não tenha sido tratada de forma aberta pela Comissão de Arbitragem
da CBF é nítida a existência de uma orientação para que os árbitros deixem o
jogo “correr” mais. Os choques têm sido considerados normais e nem todo
esbarrão é interpretado como falta. E isso tem contribuído de forma sensível para
o aumento da dinâmica nas partidas. Mesmo a polêmica punição severa das
reclamações pode se tornar algo positivo a médio/longo prazo. Existe uma
cultura enraizada no Brasil que coloca o árbitro como outro adversário a ser
derrotado. Quanto menos os atletas se preocuparem com os árbitros, maior a
possibilidade de se concentrarem exclusivamente na partida que estão
disputando. Logicamente, ainda veremos expulsões exageradas até que o novo
sistema encontre seu equilíbrio, contudo, quando isso acontecer, a tendência é
que todos saiam ganhando.
Outro movimento bastante positivo é a evolução da média de público
dentro do campeonato. Apesar dos 16.392 pagantes desta temporada ainda não ter
ultrapassado os 16.537 de média total registrada em 2014, a curva que determina
o aumento de público é visível e auspiciosa. São mais de 20 mil em julho, sendo
que a décima sexta rodada tem tudo para ser a de maior público até o momento
com quebra de recorde do campeonato na partida entre Flamengo e Santos no
Maracanã. Difícil especificar todos os fatores para o aumento do público, uma
vez que o preço médio do ingresso continua alto. Mas é possível citar alguns
como o novo horário das 11 da manhã, a presença de Atlético Mineiro e
Corinthians nas primeiras colocações da tabela, o fantástico apoio da torcida
do Palmeiras (dono da maior média) e a chegada do atacante Paolo Guerrero inflamando
os torcedores do rubro-negro carioca.
Enquanto algumas coisas se transformam internamente, boas notícias
surgem do meio externo ao esporte. Quase que simultaneamente às ações do FBI
que desmantelaram um esquema de corrupção na FIFA e culminaram com a prisão do
ex-presidente da CBF, José Maria Marin, houve a aprovação no Senado Federal da
Medida Provisória 671, também conhecida como MP do Futebol, na prática,
trata-se do primeiro passo para o fim das gestões temerárias que tantos danos
causaram ao nosso futebol. Evidentemente, a chamada Bancada da Bola trabalha
para diminuir os impactos da MP, entretanto, dificilmente conseguirão barrar o
cerne da matéria. Não há dúvidas de que o futebol brasileiro deveria ser mais
autônomo, mas se não é capaz de se auto-regular, que a moralização venha de
fora.
Paralelamente, não se nota grandes mudanças em nossa imprensa esportiva.
A perigosa mistura entre esporte e entretenimento está mais presente do que
nunca e isso se nota até em espaços onde a informação ainda sobrevive como o
principal ativo. Está claro que a audiência norteia a mídia e isso não seria
diferente no esporte, porém, a busca pela qualidade não pode ser deixada em
segundo plano. Análises táticas mais profundas e debates mais elevados não
deveriam ser exceções num grande universo de mesas redondas que levam do nada a
lugar nenhum. Do mesmo modo, as entrevistas deveriam questionar muito mais sobre
o jogo, em vez de alimentar intrigas e fomentar a eterna corda bamba em que
vivem os treinadores. Não há dúvida que todos sairiam ganhando com isso.
Sobretudo, o futebol tão massacrado no país que um dia o classificou como casa.
Imagem: Eduardo Anizelli/Folhapress
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