Sempre concordei com a frase “a beleza está nos olhos de quem vê”. Trata-se de uma sentença quase definitiva, pois dela se subentende não só que o bonito para um não é necessariamente o mesmo para o outro e, do mesmo modo, deixa implícito que cada gosto deve ser respeitado por ser único. Curiosamente, tal entendimento tem pouco valor no futebol. Para muitos, alguns estilos estão acima dessa avaliação. O melhor exemplo disso está na indignação sentida por aqueles que não entendem como alguém pode não gostar do modo espanhol de se jogar. Não o estilo vertical e mortal que caracterizou a massacrante vitória sobre a Itália na final da Euro, mas o jogo insosso que conduziu a campeã mundial até a decisão continental. E o pior é a dedução de que aqueles que não gostam do tiki-taka importado do Barcelona é porque gostam apenas de marcação e chutão para frente. Convenhamos, uma visão mais do que simplista.
No caso da Espanha, provavelmente pelo uso constante da técnica privilegiada aliada aos resultados indiscutíveis, tornou-se “absurdo” ver e não gostar. Todavia, arrisco dizer que, sem os resultados, a Furia seria vista como um time de “armandinhos” que roda e roda a bola chegando pouco ao seu objetivo. Logicamente, não discuto aqui a eficiência dos comandados de Del Bosque, refiro-me apenas à plasticidade do seu jogo que, vez por outra, pode induzir ao sono.
O futebol não é apenas o orgasmo do gol. Ele é composto de pequenas explosões de emoção, sejam de alegria ou tristeza, que se materializam num belo chute, num drible sensacional, na expectativa antes de uma cobrança de falta e até mesmo quando o árbitro mostra um cartão inclemente. Se uma partida disputada com pouca técnica e nenhum lance de perigo pode ser considerada modorrenta, o mesmo pode ser dito de um jogo em que um time toca a bola lateralmente esperando de maneira fria que o adversário se abra, sem arriscar um chute, economizando nos dribles e oferecendo poucos momentos grandiosos.
Para este blogueiro, alguns times históricos sintetizaram bem esse conceito particular de beleza: O Brasil de 1982. Recheado de craques, a seleção comandada por Telê Santana movimentava-se em campo de maneira surpreendente e bela. Era o futebol-arte personificado. O segundo time que mais gostei de ver foi o Real Madrid dos Galácticos. Foi incrível admirar Ronaldo, Zidane, Figo, Raúl e Roberto Carlos juntos. Em cada partida, pelo menos um lance espetacular ou uma prova de máximo talento. O terceiro, mais modesto em relação aos outros dois, foi o Santos de 2010. Em fantásticos seis meses, o time de Neymar, Ganso, Robinho & Cia. encantou o País com um futebol de sonhos e se tornou uma espécie de modelo do que gostaríamos de ver na Seleção.
Curiosamente, as três equipes citadas também ficaram conhecidas por se defenderem mal. E, óbvio, isso não é o ideal. Apesar de todo o clamor por um futebol bem jogado, ele dificilmente estará acima da necessidade da vitória. Deste modo, é possível dizer que beleza e máxima competitividade não estão intimamente ligadas, embora unir as duas coisas possa significar a perfeição. Se é que ela existe.
Imagens: AFP
15 comentários:
Outra questão é a confusão que quem joga bonito é perdedor, e quem joga feio conseguirá vencer sempre.
Concordo com o Danilo, o conceito de jogar bonito ficou muito condicionado ao resultado de 1982, quando o time jogou muito bem, mas tinha problemas defensivos e isso custou a perda da Copa; além disso, nesse caso específico, temos de lembrar que a Itália tinha um bom time: uma equipe com Zoff, Scirea, Cabrini, Conti e um matador como Paulo Rossi não pode ser considerada uma porcaria como muitos fazem aqui no Brasil (não os vi jogar na época, claro, mas vi alguns vídeos e sei da história deles no futebol). Acho que o equilíbrio nos setores faz com que a equipe possa desenvolver um futebol eficiente e não apenas as jogadas plásticas fazem o conceito de bonito no futebol para mim; o futebol de toque e domínio da Espanha e mesmo uma equipe que sabe usar a defesa podem ter sua beleza; a plasticidade dessas equipes que você citou talvez fiquem mais na memória de quem não vê futebol diariamente; acho que nesses times de futebol mais plástico, podemos lembrar o SP do Telê, enquanto o Raí estava na equipe, o Palmeiras de 1996 e o Santos de 2002 também merecem uma citação. E entendo que o Real Madrid, antes da saída do Makelele, não era tão vulnerável na defesa como se tornou após isso acontcer.
michel, apesar de não gostar do tipo de futebol executado pelos times atuais, achei seu comentário coerente em relaçao a furia e Barcelona, talvez na Espanha, não tenha manipulação de resultados.absLC
Lamentavelmente, esse é um pensamento mais ou menos recorrente, Danilo. Por muito tempo associaram o futebol de marcação ao futebol vencedor como se não fosse possível jogar ofensivamente e vencer. Felizmente, com as recentes vitórias do Barcelona, tudo isso veio abaixo.
Concordo, Alexandre. Essa questão de 82 parece ser um divisor de águas na maneira como o futebol passou a ser enxergado no Brasil. Após a derrota da Seleção no Sarriá, muitos entenderam que marcar era a prioridade e não jogar com a bola e marcar sem ela. Salvo engano, é de autoria de Celso Roth a frase "Quem marca bem, joga bem", no que eu respondo: não necessariamente. Nesse aspecto, ninguém realiza tão bem as duas coisas quanto o Barcelona.
Quanto ao Real Madrid, é verdade que com a presença de Makelele o time não era tão vulnerável. Porém, a defesa não era o forte do time que muitas vezes saía atrás no marcador e tinha que se esforçar mais do que o previsto para vencer algumas partidas teoricamente fáceis.
Luiz Carlos? Seria você, amigo? Para combinar os rivais Flamengo e Atlético, só pode ser... hehe.
Olha, não digo que os resultados na Espanha são manipulados. Mas lá, como em todo o mundo, a arbitragem costuma pender para os maiores times. Neste caso, Real Madrid e Barcelona.
Abraço.
Será que a seleção de 1982, vencendo a copa, teria conseguido jogar aquele futebol por 4 anos direto? Acredito que não. Quando um time joga por tanto tempo assim, às vezes falta inspiração. Acho injusto, porém, julgar o estilo de jogo da Espanha como feio por causa de seus momentos pouco inspirados.
Outra coisa que se deve levar em conta é que a Espanha passou a ser temida demais, enfrentando adversários cada vez mais fechados. Voltando ao exemplo da seleção de 1982, é provável que com uma vitória na copa este time também enfrentasse retrancas cada vez maiores e, por isso, passasse por alguns momentos de pouca objetividade.
A argumentação do texto é ótima e bem exemplificada. Serve de lição inclusive pra mim.
Ano passado eu twittei, no calor dos clássicos Real x Barça, que não entendia como alguém podia torcer contra o Barcelona ou não gostar do seu estilo. Claro que escrevi uma BESTEIRA.
o seu texto é corretíssimo. gosto é gosto e cada um tem o seu, em resumo. Também concordo com você que, no caso da Euro 2012, se a Espanha caísse na primeira fase 9e correu risco alto) seria taxada pela maioria de "time de armandinho".
Apenas acrescentaria ao texto que, apesar de que gosto é pessoal, há sim um senso comum, talvez universal do que é belo, bonito, agardável, em diversas áreas, inclusive futebol.
Se vc perguntar pra 100 caras, no mundo inteiro, se Zidane agradava aos olhos, diria eu que 90 responderia sim. Citei Zidane, poderia ter citado Zico, Seleção de 82 9pra quem viu, obviamente), o Real 2002, o Barça atual, flamengo de Zico, Ajax de van Gaal, etc. ACHO eu que existe um senso comum estético. O que não quer dizer que está correto ou errado, claro. MAs existe uma homogeneidade de valor.
Da mesma forma, se eprguntarmos pra 100 machos brasileiros se Isis Valverde é atraente, imagino que 99 responderiam que sim e um cabra diria não.
Há uma zona cinza, claro, entre Isis Valverde e Dercy Gonçalves, entre seleçãod e 82 e o Boring Arsenal dos anos 90...talvez a Espanha 2012 esteja nesta zona cinzenta. Mas acho eu que o Barcelona está mais para isis Valverde...rs
Abração!
Difícil dizer, Augusto. A resposta mais provável é não, pois alguns jogadores daquele Brasil já estavam próximos dos 30 e não chegaram bem em 86. No entanto, meu comentário se restringe à beleza do jogo. Nesse quesito, considero o time comandado por Telê infinitamente mais plástico que a atual Espanha.
Perfeito, Marcus. Existe essa visão "universal" do que é belo no futebol e na vida. Mas, no caso da Espanha, acho que ela está um pouco distante do que considero esse ideal de beleza. Mas, que fique claro: Isso não tem nada a ver com competitividade. Nesses termos, a Furia vem se mostrando quase imbatível.
Digamos que a Espanha seja uma Danielle Winits... hahaha.
Ontem, pela primeira vez em 14 anos, não tive a menor vontade de ver o "Linha de Passe" da ESPN Brasil; imagino que deve ter sido duro aturar o Juca Kfouri, por motivos óbvios; se você assistiu o programa, pode me dizer se fiz bem em não vê-lo?
Sobre o Real Madrid; realmente a defesa, mesmo com o Makelele sofria, pois faltava outro zagueiro bom para jogar com o Hierro que já estava ficando veterano; o problema é que em 2003 mandaram o Del Bosque embora, junto com o Hierro, e venderam o francês e, ao invés de trazerem o Vieira, trouxeram o Beckham para vender camisa e aí o time apanhou por 4 temporadas.
E concordo com as comparações Barcelona/Isis Valverde (risos)
Achei a mesma coisa de sempre, Alexandre. A bancada do Rio se manteve irritante, o Juca continuou bobalhão e o Palomino fez a dele. Porém, como o MCP estava presente, os debates com o PVC foram bons. Aliás, quando ambos se juntam, geralmente ocorrem os melhores debates do canal, dado os pontos de vista diferentes.
Mesmo assim, gravei o "Bem, Amigos" e comecei a ver hoje de manhã. Mas, por mais que me esforce, acho que não sobra mais do que uns 15 minutos aproveitáveis no programa.
Michel, gosto demais de seu blog, e é por isso que vou divulgar o meu aqui - para você lê-lo, obviamente, mas não só você.
http://opitacoboleiristico.wordpress.com/2012/07/10/as-crises-francesa-e-holandesa-que-nao-sao-economicas/
É um breve texto. Espero que leia e goste.
Salve, Felipe!
Muito bom o seu blog. Visitarei mais vezes. Parabéns!
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