sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Futebol e política

Para grande parte da crônica esportiva, a demissão do técnico Mano Menezes da Seleção Brasileira foi uma manobra política de José Maria Marin. Ao que tudo indica, o presidente da CBF quis romper com toda a estrutura montada por Ricardo Teixeira e instituir sua própria comissão. Logicamente, com essa medida, mesmo que a base da Seleção seja mantida pelo técnico Luiz Felipe Scolari, a sequência do projeto de Mano para nosso selecionado foi irremediavelmente rompida. Mas que projeto era esse?
Em seu discurso, Mano Menezes sempre se mostrou atualizado em relação às deficiências do futebol brasileiro dentro das quatro linhas. Com frequência, o ex-técnico da Seleção citava problemas com a falta de compactação, com laterais que não sabem compor uma linha de quatro, com volantes que não sabem jogar, etc. Aos poucos, tal filosofia foi sendo implantada na equipe principal e os resultados, ainda que tímidos, começaram a aparecer. Simultaneamente, ao lado do então coordenador do futebol de base, Ney Franco, Mano tentava implantar uma espécie de padronização das categorias inferiores dos clubes no que diz respeito à formação de atletas. Sem dúvida, uma iniciativa elogiável, ainda mais num país desacostumado com qualquer tipo de planejamento mais elaborado.
Porém, a política entrou em campo mais uma vez. Ao receber o convite para treinar o São Paulo, Ney ouviu do presidente Marin que não haveria problema para sua liberação. Na prática, a cúpula deixava claro que o trabalho em desenvolvimento não era tão relevante quanto se pensava e, ao mesmo tempo, reaproximava a entidade de um clube poderoso que havia sido deixado de lado ao final da gestão de Ricardo Teixeira. É bem provável que Mano Menezes tenha percebido ali que o sucessor de Teixeira não pensava como ele. Isso, somado à falta de qualquer manifestação que desse segurança ao treinador deixava claro que a mudança poderia acontecer a qualquer momento. Até que aconteceu.
Com a demissão de Mano, uma onda de críticas varreu o Brasil. De repente, ninguém era a favor da troca do comando técnico. Quem acompanhava à distância até poderia acreditar que o trabalho estava obtendo êxito mesmo sem resultados significativos. Concomitantemente, surgiu o boato de que o espanhol Pep Guardiola estaria aberto a um convite para treinar o Brasil. Era a senha para que os pedidos pela contratação do ex-técnico do Barcelona invadissem programas esportivos, jornais e redes sociais. De repente, a possível chegada de Guardiola se tornou a chave para todas as mazelas do nosso esporte. Mas ninguém se dispôs a tentar explicar para o grande público por que seria.
Não há dúvidas de que Guardiola é um homem anos-luz à frente da média dos treinadores locais. Seus feitos realizados a partir da escola barcelonista estão entre as coisas mais importantes que aconteceram no futebol desde sua invenção. Só isso já bastaria para credenciá-lo ao cargo de técnico do Brasil. No entanto, tanto Guardiola quanto qualquer outro treinador só poderiam atuar no âmbito da Seleção. No máximo dar prosseguimento aos incentivos à base que Mano Menezes e Ney Franco deram início.
Sob o comando de Felipão e a coordenação de Parreira, é possível que a Seleção caminhe melhor. Apesar das boas intenções, a passagem de Mano foi apenas regular. Um bom projeto, mas que nunca encontrou o necessário respaldo dos resultados, algo que sabemos ser fundamental em qualquer coisa ligada ao esporte tupiniquim. Certo ou errado é desse modo que o raciocínio local funciona. Do mais desligado torcedor até o articulista mais renomado, sempre haverá a cobrança pelo resultado, independente do projeto.
O futebol brasileiro precisa do tão falado projeto sim, porém, como um todo. O que é realizado da Seleção pode e deve andar paralelamente a isso. Precisamos de um calendário racional, de uma política para levar público aos estádios, de uma organização que proteja os direitos dos jogadores, de medidas que equacionem as dívidas dos clubes, de um planejamento que vise aproveitar da melhor maneira os estádios que estão sendo construídos para o Mundial, de dirigentes mais profissionais, enfim, precisamos arregaçar as mangas e olhar para frente.
E isso, via de regra, não está ligado ao ocupante da cadeira de técnico da Seleção. Está bem acima dele, inclusive. E é nesse lugar onde se encontra o verdadeiro problema. Está na estrutura corrupta e viciada do futebol brasileiro. Que parte da CBF, passa pelos clubes, por profissionais da área e até pelo canal de TV que, em nome de seus interesses, sempre que pode solicita o retorno de uma fórmula de campeonato que claramente é lesiva ao planejamento das agremiações. Neste cenário, pedir Guardiola ou outro técnico estrangeiro é muito mais um sonho idealista do que uma necessidade. Neste momento deveríamos nos concentrar nos problemas reais. E são tantos.
Crédito da Imagem: Bruno de Lima, Lancenet

2 comentários:

Alexandre Rodrigues Alves disse...

O problema é parte da mídia aderir a isso, taxando de chatos, cri-cri, ou pessimistas todo aquele que critica qualquer coisa relacionada à Seleção: esconde-se os fatores reais das demissões/contratações de profissionais, para muitas vezes apenas rotulá-los como bons ou ruins; como você bem lembrou, até outro dia o Mano era um burro, agora muita gente diz que ele não deveria ser demitido.

Sobre a questão do projeto é isso: Uma coisa é a Seleção, outra é a organização do nosso futebol como um todo (calendário, clubes mais fortes, ação da CBF...) e uma idéia de jogo que possa permear nossas equipes, e aí a Seleção se beneficiaria disso fatalmente.

Michel Costa disse...

Exatamente, Alexandre. Eu também fui simpático à ideia de termos Guardiola no comando da Seleção, mas é ilusão achar que só isso bastaria. Sem contar que o espanhol não teria tempo para desenvolver um projeto capaz de mudar o futebol brasileiro de cima para baixo. E, como escrevi anteriormente, as necessidades do futebol brasileiro não têm como ponto final a Copa. Elas continuam indefinidade. Portanto, não consegui seguir a linha de raciocínio de grande parte da mídia esportiva brasileira.